As comunidades negras do Brasil
(*)
Sílvio Vieira de Andrade Filho
A grande maioria das comunidades negras do Brasil está espalhada na zona rural de alguns dos 5565 municípios brasileiros. Além das rurais, há também as ribeirinhas, as suburbanas e raramente as urbanas. Nas rurais, vivem cerca de 100 mil afrodescendentes com grande índice de analfabetismo entre os idosos. De acordo com o Ministério da Cultura, as comunidades mapeadas chegam a 724. As identificadas pela Fundação Cultural Palmares chegam a 1200. São estes os estados brasileiros com maior quantidade de comunidades: Bahia (mais ou menos 33%), Maranhão (23%), Minas Gerais (9%), Pará (5%) e São Paulo (4%).
No Estado de São Paulo, existem 31 comunidades entre as quais a do Cafundó em Salto de Pirapora com 75 habitantes. Esta comunidade, que não resulta de um antigo quilombo, tem uma fala africana denominada “cupópia” praticada atualmente por 07 usuários mais velhos numa atitude de resistência cultural. Os habitantes mais novos que freqüentam as escolas da cidade de Salto de Pirapora e que apreciam TV, numa atitude de rendição cultural, preferem não usar a mencionada fala africana e integrar-se à sociedade brasileira. Nascida no Caxambu (Sarapuí) no século 19, a “cupópia” foi analisada recentemente por este articulista num artigo publicado na revista Papia número 13 da Universidade de Brasília e numa palestra proferida no último dia 05 de novembro por ocasião do congresso denominado Tercongremulindi realizado no Anfiteatro de História da USP. Esta palestra foi precedida no mesmo dia por uma entrevista concedida por este pesquisador ao jornal matutino da Rádio USP que fez a divulgação do referido congresso de línguas africanas e indígenas ocorrido nos dias 05, 06 e 07 de novembro de 2003. Dentre os vários tipos de comunidades negras, podemos citar as tituladas que são raras. Dentre estas, existem as que não conseguiram obter o registro em cartório. Existem também as que possuem uma parte titulada e uma outra que foi ou está sendo desapropriada pelo governo. Há aquelas cujas áreas ocupam até três municípios. Há também as originárias de quilombos no sentido real desta palavra. Existem também as herdadas de seus senhores por negros libertos mesmo antes da Abolição ocorrida em 13.05.1888. Atualmente, há populações negras que tiveram que mudar de local para atendimento de necessidades sociais como a construção de hidrelétricas. Muitas comunidades sofreram invasões que culminaram com a expulsão de sua população. Muitas terras de negros ficaram reduzidas, pois foram ocupadas por invasores no passado distante que inclusive as registrou, obrigando o governo atualmente a fazer a devida desapropriação através de negociações amigáveis com os últimos proprietários considerados de boa fé e portadores de títulos considerados bons. Assim, o governo demonstra que valoriza o direito à propriedade. Geralmente, o governo tem obtido êxito em tais negociações. Além disto, o governo entende que o último proprietário não pode arcar com o ônus individualmente que deve ser de toda a sociedade brasileira.
Apesar de tituladas, as comunidades negras rurais possuem muitos problemas. De um modo geral, seus representantes reivindicam saneamento básico, telefone, policiamento, energia elétrica, posto de saúde, reforma de casas e aposentadoria para os idosos. Desejam também escolas e ensino próprios, pois acham que o ensino fora da comunidade pode provocar a perda de sua identidade. Não querem classes multi-seriadas que só servem para comprometer a aprendizagem. No caso de não haver escola na comunidade, gostariam de ter ônibus para o deslocamento dos alunos. Querem também prédio para reuniões e desenvolvimento cultural. Desejam também bolsa-escola, curso de alfabetização para adultos e ensino de técnicas agrícolas além de boa quantidade de sementes e adubos. O escoamento de seus produtos necessita de estradas e transportes. É evidente que, da mencionada lista geral, cada comunidade titulada apresenta apenas algumas reivindicações.
20 de novembro é festa de Zumbi dos Palmares e Dia Nacional da Consciência Negra.
(*) Sílvio Vieira de Andrade Filho é professor e autor do livro “Um Estudo Sociolingüístico das Comunidades Negras do Cafundó, do Antigo Caxambu e de seus Arredores”.
Diário de Sorocaba, 20.11.2003.
Site do autor:
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